E você deita, se permite
cochilar e acorda 3 horas depois e se pergunta: e agora? Sinceramente? Não sei.
Não faço a mínima ideia de como será daqui para frente. Pela primeira vez em
quase um ano eu sentei e percebi que não tinha nada para fazer por alguns dias.
É tão estranho ter essa sensação depois de meses vivendo em uma velocidade alucinante,
que eu ainda não posso acreditar. É aquele mesmo sentimento de quando você sai
de casa e fica se perguntando se esqueceu algo. É uma paz que a gente fica
relutando a imaginar se merecemos.
Os últimos 6 meses foram os
mais tristes, velozes e intensos da minha vida. Mas também foram momentos de
autoconhecimento, encontros de alma e fim de ciclo. Por isso tudo, foi tão
estranho sentar hoje e perceber que terei alguns dias para me permitir o ócio,
sumir se necessário for. Há tempos sonhava com esse momento, mas não imaginava
que ele chegaria ao pestanejar dos meus olhos.
Fevereiro tardou a se fechar,
e para falar bem a verdade, não acredito que fevereiro de 2016 se encerre na
minha vida. Vai ser sempre uma lacuna aberta, uma ferida magoada. As pessoas
talvez não entendam, mas eu me nego a falar sobre tudo aquilo, me dói muito,
não gosto e simplesmente não quero ter de lidar. Não agora. Tudo foi tão insano
que ainda me pergunto como consegui viver aqueles dias. Não há nada,
humanamente falando, que responda. Eu estou só tentando viver um dia após
outro. Tento seguir uma rotina, ocupar a mente, fazer coisas que antes não me
esforçaria para fazer. Tento me divertir e fazer piada de mim mesma, porque a
vida se tornou tão dura. A vida virou um circo sem palhaços e onde eu tive que
me tornar a equilibrista.
Quando as pessoas perguntam se
eu estou bem acho injusto dizer algo diferente do sim. Porque no meio disso
tudo eu aprendi a ser grata aos mínimos presentes que a vida me dá. Ela nos
tira bastante, porções que pensamos que não daremos conta viver sem, mas ela
também nos recompensa com pessoas e gestos de amor. Eu estou me permitindo
viver esses sentimentos novamente, preciso deles. Encontrei pessoas incríveis e
que me abriram os braços durante todo esse processo. Então, como eu poderia ser
ingrata em reclamar?
Algumas fagulhas andam
faiscando aqui dentro. Não sei definir muito bem ainda, pois é um misto de
admiração, paixão e respeito. Só sei que tirar de mim alguns sorrisos frouxos e
alguns longos textos. No final das contas, minhas emoções sempre me trazem de
volta para escrita, como se eu precisasse materializar todas minhas ideias para
poder enxerga-las com clareza. Mas gosto dessa sensação, ela dá uma noção de
estar vivendo novamente, e isso não depende de reciprocidade, até porque
sentimentos não precisam da via de mão dupla para existirem, eles simplesmente
existem e tomam conta dos dias.
Eira e beira
Onde era mata hoje é
Bonfim
De onde meu povo
espreitava baleias
É farol que desnorteia
a mim
E no meio disso tudo, eu estou
aqui sem sono, ou talvez eu apenas precise organizar essas ideias para me
deixar descansar finalmente. Maria Bethânia está cantando suas águas. Kirimurê chega dói de tão linda que é.
Me faz pensar sobre 2 de julho e remete aos reencontros que a vida me permitiu.
Como eu poderia reclamar de uma vida que me presenteou com tantas descobertas
sobre mim mesma? Não acho que teria esse direito. Por mais dores que eu tenha
que carregar comigo, no final das contas todo o aprendizado e todos os amores
que emanaram para mim já valeriam.
Imagina que hoje eu estava
ouvindo uma das minhas bandas favoritas, os mexicanos da Zoé, e fiquei aqui com
cara de quem viu a fanfarra passar. Porque Lábios Rotos faz todo sentido do mundo agora. Porque a gente se vê querendo cuidar
e proteger os outros, ou uma pessoa em especial. Eu tenho esse pavor de magoar
as pessoas, o que muitas vezes me faz recuar. Sim, eu não sou essa pessoa
inquebrável que consegue não se importar, dói muito para mim perceber que
minhas palavras ou ações podem machucar alguém. Acho muito válido usar as
palavras desculpa e perdão. Elas não matam. O que também não quer dizer que eu
não tenha um gênio dos infernos...
Entrégame tus labios
rotos los quiero besar,
Los quiero curar, los
voy a cuidar
Con todo mi amor
Voltar a ter uma vida social
descente provavelmente tem sido o maior dos esforços, porque a depressão e as
crises de ansiedade não nos permitem exercer toda a liberdade que desejamos. Então
é uma luta diária. Minha vida ganhou o seguinte mantra “um passo de cada vez e
todos os passos por ele”, é uma forma de me lembrar que eu não estou só nessa
jornada insana. Desse jeito eu me esforço ao máximo para não me deixar abater,
forço todas as minhas próprias barras.
Se eu tocar no seu
radinho
Vai ser tão bom confia
em mim
Posso preencher todo o
espaço
O calor do meu abraço
te deixa feliz
Aperta o play e me diz
você
No meio das últimas que
forcei, acabei me encantando por Tássia Reis, essa figura maravilhosa que
dispara “lacração” a cada frase do seu rap.
Imagina só, No seu radinho já virou
meu hino a permissão amorosa. Por que não?
Não é um balanço do semestre,
mas uma crônica de uma noite que dormir não seria possível sem a materialização
das ideias. No meio disso tudo eu poderia resumir minha vida nos últimos meses
entre um reencontro maternal, os amores incondicionais que descobri no meio da
dor, o subir um degrau na minha escala de satisfação pessoal e ter de lidar com
uma vésper feroz. O derramamento de palavras é necessário para fazer
transbordar umas emoções ainda não explicadas, saradas e amadurecidas. E assim
eu vou tentando seguir o fluxo das minhas vontades e necessidades, porque isso
é a direção dada pelo nosso amálgama formador. Qual o próximo passo? Não sei.
Estou só tentando respirar um pouco de cada vez, mas já tenho motivos o
suficiente para continuar caminhando.
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