Tenho ficado impressionada com
a destreza do ser humano para empacotar suas dileções. Depois do machismo
gourmet em embalagem HeForShe, estamos dando de cara com o preconceito embalado
na caixinha “não sou preconceituoso porque meu bisavô era...”. Pois bem, sinto
lhe dizer que você não tá enganando ninguém. As pessoas estão simplesmente
bancando de desconstruídas para ganhar público, mas só basta os chamados
“valores ocidentais” serem colocados em check para toda homofobia, xenofobia e
afrofobia dar as caras.
Com os recentes ataques a
alvos na Europa e EUA, muito tem se questionado as pesarosas falas surgidas nas
redes sociais e colocando a se pensar se de fato existem predileções de choro
no Facebook. Na minha opinião, só para deixar bem claro que é meu lugar de
fala, existe sim. Primeiramente, não enxergar que existe sim uma guerra em
curso é de uma demência letárgica. A grande diferença, é que relativizar os
ataques frequentes na África e Oriente é entender com os olhos da ignorância
e do preconceito que são lugares belicosos e pronto. É como se as pessoas
entendessem que “ah, eles lá vivem em constantes ataques. Eles estão em guerra.
Aqui não. Tudo é divino maravilhoso”. Acorde e melhore, todos sabemos como se
iniciou a desestabilização do Oriente Médio, mas não queremos enxergar que o
troco tá sendo dado. Chumbo trocado é guerra sim.
Mas o que existe por trás
desses discursos são coisas muito piores. Podemos ampliar o debate e levar para
outros espectros. Quando alguém relativiza esses fatos e não enxerga que há uma
expansão dos conflitos de décadas, que essas potências ocidentais implantaram em outras regiões de interesses que lhes apetecem, caracterizasse a inércia do
ser sentado em seus privilégios que prefere relativizar o ovo da galinha a
admitir que seu bairrismo antropológico é falho.
Esses mesmos tipos de
indivíduos são os que constantemente fazem coro com as minorias, mas não
passam de abutres culturais arraigados na decadência eurocêntrica. Criticar os
que se posicionam fora da curva e lutam pelas demandas sociais para eles é lei,
ser de esquerda uma aberração, uma barbárie para tais sujeitos ditos
aristotélicos.
Vamos e convenhamos, há maior
espirito de decadência do que a ode as monarquias por parte de sujeitos latino-americanos?
Para mim, isso soa como um deboche das elites falidas. Coisa de quem na rua
paga de neoliberal mas reza pai nosso de joelhos para uma imagem dos Orleans e
Bragança.
Mas nada pode se comparar com
o preconceito dentro do armário. O racial, pura afrofobia. Um exame de
consciência faz bem. Acho válido você, caro leito/leitora, se perguntar se namoraria um
homem ou uma mulher negra? Porque jogar para cima da sociedade o papo de
preferência estética não cola mais. Estamos de olho em você que diz que um cabelo
black power é feio e isso é “apenas sua opinião e gosto estético”. Opinião e
gosto estético #meuzovo. Você é preconceituoso mesmo e deixe de balela. Então
não venha querer bancar de “eu me importo com a África e Oriente”. Se importa
nada, você tem medo é que seu reino encantado no mundinho de maravilhas do
eurocentrismo venha a ruir. Liberdade, igualdade e fraternidade só para os
iguais, o resto você relativiza.
Por esses dias fiquei
estatelada na cadeira ao ouvir alguém dizer “esses cabelos devem
feder muito”, se referindo a cabelos black powers. Isso me deixa sem ação,
porque foi o tipo de discurso que eu cresci ouvindo e o tipo de casca que tive
que tirar drasticamente da minha formação. O grande problema é a não
identificação com outro, isso que leva a desumanização, fator primordial para
instalação de conflitos de todos os tipos.
Acho que seria interessante
nós começarmos a nos despir de nossas hipocrisias, coisa que é quase uma
herança cultural. Tem gente que cuida da hipocrisia que carrega com tanto
afinco que se perde em suas próprias retóricas. Vamos assumir, para a decadente
margem de privilegiados da nossa sociedade, pouco tá importando os mortos de
Aleppo, Beirute ou Latakia, estamos mesmo preocupados se nossas calçadas vão
estar cheias de imigrantes vendendo bijuterias ou se seremos capazes de tirar o
visto americano para irmos a Disney.
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