Estou há mais ou menos 2 horas
revirando na cama. Já cantei sozinha no quarto, já tentei ver TV, estudei um
pouco de Tarô, li meu projeto de pesquisa para defesa... enfim, tentei de todas
as formas afastar o pensamento de medo, insegurança e impotência que me tomaram
pela mão desde as primeiras horas do dia. Tudo me fez lembrar que cada um tem
seu Orlando de cada dia.
Eu cresci em meio a movimentos
sociais. Muitos sabem que o Sindicato dos Metalúrgicos e a sede estadual do
PCdoB foram meus jardins de infância. O que isso influenciou na minha vida? O
sentido de entender que muitas vezes esses grupos não representam anseios das
minorias. Cresci em um ambiente misógino, racista, machista e heteronormativo.
Mas surpreendentemente, e talvez sem querer- por todo desenho que a vida tomou para
si depois- meus pais alimentaram em mim muitos atributos que lhe faltavam, ou
que eles mesmos não conseguiriam vivenciar.
Da minha mãe, mesmo com toda
sua rigidez militar, tive uma liberdade religiosa absurda na infância e adolescência,
coisa que hoje seria impensável com os meandros que a vida tomou. Do meu pai,
herdei a consciência de classe e o senso de liberdade de expressão e espirito
livre. O interessante é observar que não aprendi nada disso os observando, mas
ouvindo o que eles tinham para me instruir, aconselhar. O assustador foi tomar
consciência que eles não viviam muito do discurso que me ensinaram, mas
agradeço por terem, de certa forma, me feito um ser humano diferente dos
arquétipos que tomaram para si.
Tive pais de alma, família de
alma que acolhe e ama sem dizer o porquê, sem perguntar o “de onde”. Tive
acolhimento, e ainda tenho. Vivenciei e ainda vivencio com eles, a pratica do
que só ouvi na teoria. O amor é desprendido, é livre e quando nos toma tem ares
de revolução. Ele faz nascer em nós uma inquietude, mas ao mesmo tempo nos
aconchega. Amor é calmaria e compreensão.
Cresci, tomei consciência de
mim mesma. Tenho lidado com as agruras, sabores e dissabores da vida. Tomei
noção da minha sensibilidade e empunhei a espada, raios e trovões para
acariciar minha personalidade. Sou um paradoxo, resultado de toda essa
formação. Sou reclusa, tomo meus pensamentos e embarco em dolorosas e
proveitosas jornadas tentando entender as peças de mim que ainda não se encaixam.
Estou em uma constante transformação e aceito isso como um desafio para vida. É
como a jornada do Louco em meio as tiragens do Tarô.
Em meio a tudo isso, existe o
Orlando nosso de cada dia. O que aconteceu no club Pulse é uma ampliação material do que é a jornada das minorias
durante o cotidiano. É a representação extrema do olhar de desaprovação
constante dos pais, é o tom de voz ameaçador ao telefone. São as ameaças por
não ser parte da jornada que eles, os genitores e indivíduos da sociedade,
esperavam para você. Você é o Louco sendo impedido ou recriminado em seguir sua
jornada. Seu erro? A existência.
Mas acredito na afirmação de
uma luta: o amor. Esse nos move, tira nosso sono e faz com que os sonhos se
planejem de olhos bem abertos. Isso ninguém tira de nós, os minoritários
constantemente silenciados por tiros, murros e cassetetes. Ninguém pode calar o
que vem em nosso Amálgama, a voz da nossa
alma formadora, os nosso ideais.
Espero
dias melhores, dias de celebração a vida. Sempre haverá em mim uma sonhadora
romântica e de espirito tempestuoso. No final das contas, nós só queremos o
amor, com sentimento e personificado no sorriso mais lindo e nos olhos mais
sinceros. No final das contas, ainda restará para nós, as tardes e noites entre
amigos e o flerte que nós faz sonhar de olhos vidrados. Isso nenhuma arma,
ideologia fascista, fundamentalismo religioso e a sociedade que nos formou
poderá mudar. NUNCA. Sendo isso dito, vou dormir e me preparar para os novos
caminhos que essa jornada oferece. Um recado para os do contra: daremos mais
close e fascistas e fundamentalistas NÃO PASSARÃO. Já os amores e seus
encantos...ah, esses são eternos e para eles sempre terei canções.
1 comentários:
Começando pelo começo, eu conheço bem essa sensação de inquietação que nos leva a não consegui dormir, comer ou parar antes de escrever, chamo de "ou escrevo ou morro!".
As vezes, não sempre e nem constantemente, só as vezes eu "acordo para a mesma vida para que tinha dormido" e penso: Meu Deus, estou em uma distopia, todos os sonhos falharam! Hoje é um desses dias, porque não vi as notícias ontem... Como pode algo assim? Como alguém pode levar seu ódio a esse estremo? Como as pessoas que sobreviveram vão levar suas vidas? Qual o valor da vida quando diariamente tantas coisas nos são tiradas?
Mas, no meio do desespero sempre tem qualquer coisa que nos alenta... um sopro de vida, uma gota de água, um pedaço de terra fértil e a esperança não precisa de muita coisa para brotar... os amores e encantos são eternos...
Obrigada Dona Alice...
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